Os sortudos
parados à chuva na auto-estrada, 6:15 da tarde,
estes são os sortudos, estes são os
trabalhadores zelosos, a maioria com os rádios o mais
alto possível para tentarem não pensar nem recordar.
esta é a nossa civilização: antes os homens
viviam nas árvores nas cavernas agora vivem
nos automóveis na auto-estrada enquanto
a rádio local é ouvida vezes sem conta e
mudamos de primeira para segunda e outra vez para primeira.
há um pobre desgraçado empatado na faixa de acelaração, capô
levantado, encostado ao muro da auto-estrada
à chuva com um jornal sobre a cabeça.
os outros carros contornam com dificuldade o carro dele, e passam para
outra faixa onde há carros determinados a não os deixar passar.
à minha direita um condutor é seguido por um
carro da polícia com as luzes vermelhas e azuis ligadas – de certeza
que não vai em excesso de velocidade quando
de repente a chuva cai como uma onda gigante e todos os
carros param e
mesmo de janela fechada consigo cheirar a embreagem
de alguém a queimar.
só espero que não seja a minha quando
a onda de água diminui e metemos outra vez a
primeira; estamos todos parados
longe de casa e eu memorizo
a silhueta do carro à minha frente e a forma da
cabeça do condutor ou
aquilo
que consigo ver por cima do encosto da cabeça enquanto
o autocolante do pára-choques me pergunta
JÁ ABRAÇOU HOJE O SEU FILHO?
de repente sinto uma enorme vontade de gritar
quando outra onda de água cai novamente e o
homem da rádio anuncia que haverá 70 por cento
de hipóteses de ocorrerem aguaceiros amanhã à noite
(Charles Bukowski)
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