28 agosto 2010

Se os Poetas Fossem Menos Patetas


Se os Poetas Fossem Menos Patetas



Se os poetas fossem menos patetas

E se fossem menos preguiçosos

Faziam toda a gente feliz

Para poderem tratar em paz

Dos seus sofrimentos literários

Construíam casas amarelas

Com grandes jardins à frente

E árvores cheias de zaves

De mirliflautas e lizores

De melfiarufos e toutiverdes

De plumuchos e picapães

E pequenos corvos vermelhos

Que soubessem ler a sina

Havia grandes repuxos

Com luzes por dentro

Havia duzentos peixes

Desde o crusco ao ramussão

Da libela ao papamula

Da orfia ao rara curul

E da alvela ao canissão

Havia um ar novo

Perfumado do odor das folhas

Comia-se quando se quisesse

E trabalhava-se sem pressa

A construir escadarias

De formas antes nunca vistas

Com madeiras raiadas de lilás

Lisas como ela sob os dedos



Mas os poetas são uns patetas

Escrevem para começar

Em vez de se porem a trabalhar

E isso traz-lhes um remorso

Que conservam até à morte

Encantados de ter sofrido tanto

Dedicam-lhes grandes discursos

E são esquecidos num dia

Mas se trabalhassem mais

Só seriam esquecidos em dois



( Boris Vian )

Nenhum comentário: