29 setembro 2010

Poeminha de Insatisfação Absoluta


Poeminha de Insatisfação Absoluta




O que me dói

É que quando está tudo acabado

Pronto pronto

Não há nada acabado

Nem pronto pronto

Pintou-me a casa toda

Está tudo limpado

O armário fechado

A roupa arrumada

Tudo belo, perfeito.

E no mesmo instante

Em que aperfeiçoamos a perfeição

Uma lasca diminuta, ténue, microscópica,

Não sei onde,

Está começando

Na pintura da casa

E as traças, não sei onde,

Estão batendo asas

E a poeira, em geral, está caindo invisível,

E a ferrugem está comendo não sei quê

E não há jeito de parar.



( Millôr Fernandes )

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