21 setembro 2010

Saudação Aos Que Vão Ficar


Saudação Aos Que Vão Ficar




Como será o Brasil

no ano dois mil?

As crianças de hoje,

já velhinhas então,

lembrarão com saudade

deste antigo país,

desta velha cidade?

Que emoção, que saudade,

terá a juventude,

acabada a gravidade?

Respeitarão os papais

cheios de mocidade?

Que diferença haverá

entre o avô e o neto?

Que novas relações e enganos

inventarão entre si

os seres desumanos?

Que lei impedirá,

libertada a molécula

que o homem, cheio de ardor,

atravesse paredes,

buscando seu amor?

Que lei de tráfego impedirá um inquilino

- ante o lugar que vence -

de voar para lugar distante

na casa que não lhe pertence?

Haverá mais lágrimas

ou mais sorrisos?

Mais loucura ou mais juízo?

E o que será loucura? E o que será juízo?

A propriedade, será um roubo?

O roubo, o que será?

Poderemos crescer todos bonitos?

E o belo não passará então a ser feiura?

Haverá entre os povos uma proibição

de criar pessoas com mais de um metro e oitenta?

Mas a Rússia (vá lá, os Estados Unidos)

não farão às ocultas, homens especiais

que, de repente,

possam duplicar o próprio tamanho?

Quem morará no Brasil,

no ano dois mil?

Que pensará o imbecil

no ano dois mil?

Haverá imbecis?

Militares ou civis?

Que restará a sonhar

para o ano três mil

ao ano dois mil?



( Millôr Fernandes )

Nenhum comentário: